Na sessão plenária realizada na Assembleia Legislativa das Linhas de Acção Governativa na área da Administração Pública e Justiça, no passado dia 24 de Novembro, foi salientada e discutida a necessidade de criação de uma nova escola superior ou universidade de direito e ciência política, vocacionada para a formação de juristas bilingues e para a tradução. O debate teve por base a falta de qualidade dos licenciados formados no Curso de Direito em Língua Chinesa, que se reflecte na falta de juristas bilingues qualificados e na fraca percentagem dos candidatos admitidos por ocasião dos exames para admissão nos últimos Cursos de Formação de Magistrados, bem como a frequência sistemática, desde 2004, pelos jovens chineses locais, cerca de 20 pessoas por ano, de cursos de direito realizados em Portugal, com o patrocínio de uma associação privada local, isto é, desde 2004 até à data, mais de 150 jovens locais deslocaram-se a Portugal para aprenderem direito. Tudo isto terá originado a perda de confiança da comunidade e do mercado local na qualidade dos licenciados de direito em língua chinesa formados na Faculdade de Direito da Universidade de Macau
Posteriormente foi publicado, dia 1/12/2010, um artigo no JTM, referenciado como publicidade, intitulado «A UM no caminho da excelência – relatório no 6», onde são abordadas várias questões relacionadas com os cursos de direito da Faculdade de Direito da Universidade de Macau. É referido, a título de exemplo, que até à presente data graduaram-se na FDM cerca de mil licenciados em Direito e que um «considerável número de graduados é já uma elite no meio jurídico, reconhecida como tal na comunidade de Macau. (…) Segundo dados estatísticos da Universidade de Macau, mais de 90% dos juízes, procuradores públicos e advogados de nacionalidade Chinesa são licenciados em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Macau ou graduados no Curso de Introdução ao Direito de Macau, que a mesma Faculdade oferece». É, também, salientada a publicação de livros de direito e de duas revistas jurídicas editadas pela FDM.
É claro que a importância da FDM na formação de juristas e na consolidação de um sistema jurídico de qualidade em Macau é inquestionável e esse caminho tem sido realizado desde 1988, ano em que começou a funcionar o Curso de Direito em língua portuguesa e desde 1996, quando entrou em funcionamento o Curso de Direito em língua chinesa. O Boletim da Faculdade de Direito, bilingue, uma das revistas jurídicas mencionadas no artigo do jornal que referimos, é publicado há catorze anos.
A formação de juristas, no Direito de Macau, essencial para cumprir o princípio da continuidade do ordenamento jurídico previsto na declaração Conjunta e na Lei Básica, pressupõe que a sua formação seja assegurada por docentes conhecedores do direito de Macau, já que o ordenamento jurídico de Macau, baseado no sistema jurídico português de tradição romano-germânica, tem características próprias que o distinguem, por exemplo, dos ordenamentos jurídicos de Hong Kong, baseado no sistema jurídico da Grã-Bretanha de tradição anglo-saxónica, «common law», e do Interior da China. Mesmo admitindo que o sistema jurídico do Interior da China segue a tradição romano-germânica tem, no entanto, características próprias fruto das condições sócio-políticas em que se desenvolveu.
No artigo que mencionamos é referido, aludindo aos licenciados da Faculdade de Direito que dominam o português e o chinês, que «só nos últimos anos alguns licenciados de boa qualidade mostraram interesse no ensino a tempo inteiro. Por outro lado, perante os rigorosos requisitos de aptidões académicas estabelecidos para o recrutamento de docentes a tempo inteiro, com a preocupação da necessidade de atrair mais juristas locais qualificados para ensinar o Direito de Macau, a Faculdade diminuiu apropriadamente os requisitos em aptidões académicas, experiência de leccionação e concretização de projectos de investigação aos candidatos a vagas para Assistentes. Mas mesmo assim há uma grande dificuldade em contratar um número suficiente de docentes locais a tempo inteiro. Mas apesar das dificuldades no recrutamento de docentes a tempo inteiro, a Faculdade de Direito conta com uma equipa de docentes a tempo parcial bem formados e especializados, que têm assumido uma importante carga lectiva».
A dificuldade para contratar docentes a tempo inteiro para leccionarem na Faculdade de Direito não é nova e remonta à génese do Curso. Vários aspectos contribuíram para isso, nomeadamente ligados ao estatuto da carreira, mas em 1996, quando entrou em funcionamento o Curso de Direito em língua chinesa, foram docentes bilingues, que se licenciaram no Curso de Direito em língua portuguesa, que asseguraram a docência e a maioria, senão a totalidade, a tempo parcial. Essa tendência foi tentando ser invertida quando começaram a surgir os primeiros licenciados, que foram contratados como docentes.
As informações que têm sido publicadas, relacionadas com a formação de juristas e com a, eventual, necessidade de criação de uma nova instituição de direito, levaram-nos a recolher alguns dados, sobretudo sobre o Curso de Direito em língua chinesa da Faculdade de Direito de Macau. Assim, desde 2005 não foram contratados docentes licenciados pela Faculdade para leccionarem no Curso de Direito em língua chinesa da Faculdade de Direito de Macau. Por outro lado no ano lectivo 2009/2010 a Faculdade tomou a iniciativa de não renovar contratos de docentes a tempo parcial que se licenciaram pela Faculdade. Têm sido, entretanto, contratados docentes cuja formação foi feita no Interior da China ou noutros ordenamentos jurídicos. Alguns desses docentes são contratados para leccionar nos cursos de mestrado ou doutoramento e, posteriormente, substituem os docentes locais no curso de licenciatura.
Enfim se é necessário contratar docentes locais a tempo inteiro cremos que entre os alunos que concluem o curso é natural que haja licenciados que, pela sua qualidade, podem ser contratados como docentes, mas é necessário, também, criar condições para melhorar o estatuto da carreira docente. No Curso de Direito em língua portuguesa funciona apenas uma turma no período nocturno e no Curso de Direito em língua chinesa há duas turmas em funcionamento, uma no período da manhã e outra no período nocturno, há que criar condições para que os licenciados pela FDM frequentem os cursos de mestrado e, posteriormente, de doutoramento para que possam desenvolver investigação.
7/12/2010