A proposta de lei de alteração do regime do imposto profissional apresentada pelo governo foi aprovada, unanimemente, na generalidade, pelos deputados da Assembleia Legislativa (AL).
O novo regime prevê o pagamento de imposto profissional pelos funcionários públicos, professores e membros do clero a partir de 1 de Outubro de 2003. Na apresentação da proposta, dia 18/6/2003, o governo explicou que as alterações visavam aplicar o regime a toda a sociedade.
Decisão política
Se considerarmos que se trata de uma decisão política o governo deveria ter em conta que no período de transição todos os discursos apontaram no sentido da estabilidade e da manutenção do sistema. Responsáveis políticos, ao mais alto nível, chineses e portugueses pediram aos funcionários para permanecerem para contribuírem para a estabilidade. Foi evocado o sentido patriótico e a segurança e as garantias que a Lei Básica previa.
Nesse sentido era evocado o primeiro parágrafo do artigo 98.º da Lei Básica que dispõe que «à data do estabelecimento da Região Administrativa Especial de Macau, os funcionários e agentes públicos que originalmente exerçam funções em Macau, incluindo os da polícia e os funcionários judiciais, podem manter os seus vínculos funcionais e continuar a trabalhar com vencimento, subsídios e benefícios não inferiores aos anteriores, contando-se, para efeitos de sua antiguidade, o serviço anteriormente prestado». A Lei Básica foi aprovada e promulgada pela R.P.C. em 1993 para entrar em vigor em 1999. Em 1995 os funcionários do quadro tiveram a possibilidade de optar por permanecer nos quadros de Macau, integrar-se nos quadros em Portugal ou desvincularem-se recebendo uma «bolada». Em 1998 os funcionários além do quadro tiveram, também, hipótese de optar pelas soluções referidas.
Foram enfim criadas expectativas e esta medida pode não promover a confiança. Efectivamente, impor de um dia para o outro um imposto significa, em termos objectivos, uma redução do vencimento recebido, sem que alguém tivesse conseguido explicar o que tinha mudado entretanto em Macau para que assim acontecesse. Que razões havia para que os funcionários não pagassem imposto sobre os seus vencimentos e agora tenham que pagar. Se a ideia era corrigir uma situação em respeito do princípio da igualdade pelo menos, como solução alternativa, numa fase inicial o Governo poderia ter optado por prever a sua introdução faseada, por exemplo, ao longo de 5 anos.
Note-se que o pagamento de imposto profissional surge quando as receitas do jogo têm vindo a subir e a ultrapassar as previsões do governo. O governo previa para 2003 receitas provenientes do jogo no valor de seis mil e quatrocentos milhões de patacas e, em apenas oito meses, as receitas atingiram seis mil milhões. Ou seja em 2003 é provável que as receitas do jogo atinjam nove mil milhões de patacas.
O novo regime do imposto alterou o rendimento anual a partir do qual é calculado o imposto profissional que passa de 85 mil para 95 mil patacas e as taxas de tributação variarão entre 7 e 12 por cento contra 10 e 15 por cento anteriormente. A redução do número de contribuintes, derivada das alterações referidas, vai ser compensada com a tributação dos funcionário públicos. Assim o número de contribuintes manter-se-á por volta dos 27 mil e a receita arrecadada rondará, em 2004, os mesmos 250 milhões de patacas de 2002.
Justiça e Igualdade
O governo tem argumentado que o pagamento do imposto profissional pelos funcionários públicos, detentores de cargos políticos e membros do clero de qualquer religião «é um acto de justiça» para a sociedade e que, a partir de agora, somos todos iguais e cumprimos todos os nossos deveres fiscais.
Note-se que os direitos fundamentais, como a igualdade, não expressam valores formais, ou seja, não se deve impor a igualdade apenas por amor à igualdade ou porque a lei o diz. Pelo contrário, devem respeitar-se as diferenças quando elas sirvam para corrigir situações que não são iguais. E de facto, é inegável que os funcionários públicos têm de diferente o facto do seu «patrão» ser o próprio Estado. Impor-lhes o pagamento de impostos é o mesmo de terem que devolver uma parte do seu vencimento ao próprio patrão. Se assim é, deve presumir-se que esse pagamento está já incluído na determinação dos salários. Caso contrário, parece que o Estado vai dar e tirar ao mesmo tempo.
Isenções
No debate na generalidade o governo defendeu o fim da isenção do pagamento de imposto profissional pelos funcionários, mas esclareceu que, relativamente aos contratos individuais de trabalho que prevêem uma cláusula de isenção de imposto profissional, só quando os contratos fossem renovados é que o pagamento se passaria a efectuar.
Os contratos individuais de trabalho, objecto da cláusula referida, são, por exemplo, celebrados com pessoal recrutado ao exterior, nomeadamente juristas. Assim quem assinou um contrato por dois anos pouco antes da aprovação da lei vai estar isento do pagamento de imposto profissional por dois anos.
Não temos dúvidas que o princípio da legalidade em matéria de impostos se sobrepõe às cláusulas convencionais, logo deverá, nestes casos, ser a entidade empregadora a suportar o imposto e não o trabalhador a ficar dele isento.
06/10/2003