Foi aprovado na Assembleia Legislativa (AL), na generalidade, dia 12/11/2015, o projecto de lei denominado «Alteração do regime jurídico de arrendamento previsto no Código Civil». Vinte e oito deputados votaram a favor e um absteve-se.
A iniciativa legislativa partiu de Chan Meng Kam, deputado eleito directamente e membro do Conselho Executivo da RAEM, órgão destinado a coadjuvar o Chefe do Executivo na tomada de decisões, conforme estipula o artigo 56.º da Lei Básica de Macau.
Até à data, não existe diploma que possibilite controlar as rendas de bens imóveis e é sabido que a especulação imobiliária está instituída em Macau há vários anos. Num texto denominado «Comportamentos – temos os bem comportados e os mal comportados!», de autoria de Albano Martins, publicado no JTM de 11/9/2015, é referido, relativamente ao preço das habitações, que com dados compilados da Direcção dos Serviços de Finanças e da Direcção dos Serviços de Estatística e Censos «os preços terão crescido no período observado (Setembro de 2005 a Julho de 2015) cerca de 660 por cento!».
Dois projectos de lei que visavam controlar as rendas de bens imóveis, apresentados na AL, em 2013, pelo deputado José Pereira Coutinho, eleito directamente, e em 2014, em conjunto com o seu colega Leong Veng Chai, não foram aprovados, na generalidade. O projecto de lei debatido e votado na generalidade no dia 22/05/2013, denominado «Regime da Actualização das Rendas de Bens Imóveis Destinados a Habitação»», teve quatro votos a favor, onze contra e cinco abstenções, dez deputados não estiveram presentes no plenário. O projecto de lei debatido e votado na generalidade no dia 2/1/2014, denominado «Regime da Actualização das Rendas de Bens Imóveis», teve sete votos a favor, dezoito contra e cinco abstenções, tendo os sete deputados nomeados pelo Chefe do Executivo à AL votado contra. O deputado Chan Meng Kam absteve-se, mas tinha votado contra o projecto de lei apresentado em 2013.
Em 2015, o deputado José Pereira Coutinho voltou a apresentar um projecto de lei sobre o regime de actualização das rendas de bens imóveis destinados a habitação, mas acabou por o retirar, acabando por subscrever o projecto de lei de Chan Meng Kam, que foi subscrito por nove deputados. Segundo referiu, retirou o projecto após vários deputados o terem contactado nesse sentido, mostrando-se confiante que o novo projecto seria aprovado na AL. Assim aconteceu e desta vez os sete deputados nomeados pelo Chefe do Executivo à AL votaram a favor do projecto, que, antes da votação na AL, foi enviado ao Chefe do Executivo.
O projecto de lei agora aprovado foi enviado à 3.ª Comissão Permanente da AL para análise na especialidade.
Há aspectos do diploma que merecem ser melhorados pelos deputados, na comissão especializada.
Por exemplo, não há nenhuma garantia de que o limite de actualização das rendas se aplique no caso de o inquilino mudar. Portanto, o senhorio tem uma maneira muito simples de contornar esse limite: logo que possa, denuncia o contrato e celebra um novo com outro inquilino, impondo a renda que quiser. O projecto de lei apresentado na AL, em 2013, pelo deputado José Pereira Coutinho não acautelava esta situação, mas o projecto de lei apresentado na AL pelo deputado José Pereira Coutinho e por Leong Veng Chai, em 2014, previa, no artigo 3.º, n.º 3, uma norma nesse sentido.
Por outro lado, a fixação do próprio coeficiente de actualização anual de renda fica, nos termos do artigo 999.º, n.º 1, al. a) e 999.º, n.º 2 do projecto de lei, inteiramente confiada ao Chefe do Executivo, ao permitir-lhe ter em conta, não só o índice de preços no consumidor, mas também a situação do mercado imobiliário, um dos factores que condiciona essa situação à evolução dos preços de compra e venda. Ora, este projecto de lei nada faz no sentido de controlar esses preços. Nos projectos de lei apresentados na AL, em 2013 e 2014, que não foram aprovados na generalidade, o coeficiente de actualização anual de renda estava estipulado no artigo 3.º e baseava-se, apenas, na variação do índice de preços no consumidor, sem habitação.
O diploma aprovado facilita os despejos através da dispensa de processo judicial para resolução do contrato, nomeadamente em casos de falta ou atraso no pagamento da renda, através da permissão do recurso a arbitragem, sendo a decisão arbitral título executivo suficiente para o despejo. Se o inquilino quiser evitar o despejo, terá ele próprio de, rapidamente e a expensas suas, intentar uma acção judicial de recurso dessa decisão arbitral. O projecto de lei prevê, também, que a parte interessada na resolução do contrato opte por ir a tribunal em vez de recorrer à arbitragem. Só que é óbvio que o senhorio interessado em despejar o inquilino deve recorrer ao meio mais expedito.
O projecto de lei prevê o aumento de dois para três anos do prazo mínimo de garantia de subsistência do arrendamento para os casos de arrendamento comercial ou para exercício de profissões liberais. É positivo, mas o prazo dos arrendamentos para a habitação permanece em dois anos e o direito a habitação não vale menos do que o direito ao exercício de uma actividade comercial ou de uma profissão liberal.
O diploma exige o reconhecimento notarial de assinaturas para os contratos de arrendamento visando-se, de acordo com a nota justificativa ao projecto de lei, «prevenir, eficazmente, o arrendamento de fracções por parte de malfeitores e garantir a segurança habitacional dos residentes».
O conceito de malfeitor nem sequer é uma categoria jurídica e não se consegue entender a quem vai ser aplicado e, por outro lado, não compete aos notários impedir «malfeitores» de arrendar uma casa.
22/11/2015